PT23359 – Carteira de clientes 06-09-2019 Uma empresa adquiriu uma carteira de clientes a uma empresa de mediação de seguros. Como proceder em relação ao lançamento contabilístico? Parecer técnico A questão colocada refere-se com o registo contabilístico da aquisição de uma carteira de clientes por parte de uma empresa de mediação de seguros, enquadrada no normativo contabilístico para as microentidades (NC-ME). Nos termos do parágrafo 49 a) da Estrutura Concetual do SNC (EC), os ativos são definidos como recursos controlados pela entidade como resultado de acontecimentos passados e dos quais se espera que fluam para a entidade benefícios económicos futuros. O controlo sobre recursos está, normalmente, associado a direitos legais, incluindo o direito contratual. Ainda assim, para determinar a existência dum ativo, o direito legal sobre determinado contrato não é necessariamente essencial, devendo atender-se à substância económica das operações para além da forma legal. Se os benefícios económicos associados aos referidos direitos contratuais irão fluir, direta ou indiretamente, para a sociedade poderia eventualmente concluir-se que existe algum tipo de controlo da sociedade sobre esses direitos. No caso em concreto da aquisição da carteira de clientes, está em causa os direitos associados a contratos estabelecidos com clientes, pelo que, o eventual o ativo a reconhecer seria um ativo intangível tratados no capítulo 8 da NC-ME - Ativos intangíveis (atendendo que a entidade em análise está enquadrada na NC-ME). É neste capítulo que está previsto o tratamento contabilístico dos ativos intangíveis, estabelecendo os critérios de reconhecimento e de mensuração, bem como as informações a serem divulgadas, relativas aos dispêndios associados a este tipo de ativos. De acordo com o parágrafo 8.2 da NC-ME, «um ativo intangível deve ser reconhecido se, e apenas se, for identificável, e cumprir as condições de reconhecimento definidas no capitulo 3 desta norma, desde que se trate de um ativo não monetário, identificável e sem substância física, que se espera que seja usado durante mais do que um período.» No parágrafo 3.3 da NC-ME encontramos as condições de reconhecimento. No caso concreto de um ativo o seu reconhecimento no balanço deve acontecer «quando for provável que os benefícios económicos futuros fluam para a entidade e o ativo tenha um custo ou um valor que possa ser mensurado com fiabilidade.» Resumindo, para que um dispêndio possa ser definido como um ativo intangível, reconhecido no balanço, não deve ter substância física, que se espera que venha a ser utilizado durante mais do que um período, que haja expetativa de gerar benefícios económicos futuros, o valor seja mensurado com fiabilidade e que esse intangível seja identificável. No caso em concreto, pressupomos que a entidade adquire separadamente a carteira de clientes, não adquirindo o resto do património da empresa, pagando para o efeito um preço estabelecido pelo vendedor por tal recurso intangível. Nestas circunstâncias trata-se da aquisição de direitos, logo sem substância física, em que está a prever que esse valor pago irá gerar benefícios económicos futuros para a entidade. Desta forma, o primeiro critério de reconhecimento de um ativo intangível está sempre cumprido neste tipo de situações, uma vez que a probabilidade de que fluam benefícios económicos futuros para entidade está refletida no custo do ativo intangível, ou seja, no respetivo dispêndio incorrido. Por outro lado, o custo desse ativo intangível adquirido separadamente da entidade pode ser mensurado com fiabilidade, uma vez que esse custo normalmente está definido em dinheiro ou em outros ativos cedidos, cumprindo, assim, o segundo critério de reconhecimento dos ativos intangíveis. Quanto à questão da identificabilidade o parágrafo 8.3 da NC-ME refere que o ativo intangível é identificável se: «a) For separável, isto é capaz de ser separado ou dividido da entidade e vendido, transferido, licenciado, alugado ou trocado, seja individualmente ou em conjunto com um contrato, ativo ou passivo relacionado, independentemente da intenção da entidade de o fazer; ou b) Resultar de direitos contratuais ou de outros direitos legais, independentemente desses direitos serem transferíveis ou separáveis da entidade ou de outros direitos e obrigações.» No caso dos dispêndios de contratos com clientes, estes apenas podem cumprir a definição de ativo intangível quando em resultado de direitos legais ou contratuais, a sociedade em causa possa manter o controlo do relacionamento com esses clientes ou a sua fidelidade para com a empresa, de forma a garantir que os benefícios económicos futuros relacionados com esses clientes continuem a fluir para a empresa. Cabe ao órgão de gestão da empresa efetuar julgamentos e juízos de valor sobre a operação em causa, para perceber se, não existindo contratos ou legislação que obrigue os clientes a manter as relações com a empresa adquirente (dos contratos), pela existência de operações de compra e venda de contratos de clientes que habitualmente são efetuadas, é mais provável do que não, que de esses clientes continuem os seus relacionamentos com a empresa adquirente. Como já referimos anteriormente, o critério geral de reconhecimento dos ativos intangíveis, estabelece que os estivos intangíveis apenas devem ser reconhecidos como tal, quando seja provável que os benefícios económicos futuros relacionados diretamente com esse ativo intangível fluam para a entidade, e quando o custo desse ativo possa ser fiavelmente mensurado. Em termos de mensuração, o ativo intangível deve ser registado inicialmente pelo seu custo, que inclui o preço de compra líquido de descontos, despesas acessórias e outros custos diretos necessários à preparação do ativo para ser usado pela entidade, ficando, de seguida, sujeito a amortizações e a imparidades. Conclui-se, desta forma, que se a carteira de clientes for adquirida a uma outra entidade separadamente, ou seja, não seja adquirida em conjunto com o restante património, esta pode eventualmente ser registada pela entidade adquirente como um ativo intangível, desde que cumpra com os critérios de reconhecimento anteriormente mencionados. No caso de estarem cumpridos os critérios, a aquisição da carteira de clientes deverá ser efetuado na conta 44x – Ativos intangíveis. Em termos de mensuração subsequente do ativo intangível, em termos de amortização, há que avaliar a existência de vida útil finita para determinar a quantia amortizável da carteira de clientes. Nos termos do parágrafo 8.14 da NC-ME, quando a vida útil do ativo intangível dependa de direitos contratuais ou de outros direitos legais (por exemplo, carteiras de clientes), a vida útil é definida até ao período prevista para o exercício desses direitos contratuais ou legais. No caso desses direitos contratuais ou legais de utilização da carteira de clientes forem adquiridos por um prazo limitado que possa ser renovado, a vida útil da carteira de clientes deve incluir esse (s) período (s) de renovação, mas apenas se existir evidência que suporte a renovação pela entidade sem um custo significativo. Se não for possível determinar com fiabilidade a vida útil da carteira de clientes, tendo uma vida útil indefinida, esse ativo intangível deve ser amortizado em dez anos, conforme o parágrafo 8.17 da NC-ME. Em termos fiscais, o artigo 16.º do Decreto Regulamentar n.º 25/2009, de 14 de setembro, estabelece que são aceites como gastos fiscais as amortizações de ativos intangíveis sujeitos a deperecimento, nomeadamente quando tenham uma vigência temporal limitada. A carteira de clientes pode ser enquadrada na alínea b) do n.º 2 do artigo 16.º do DR 25/2009, desde que se possa determinar com segurança que os contratos com os clientes tenham um período limitado de tempo. A taxa de amortização fiscal deve ser determinada em função desse período limitado de tempo de utilização da carteira de clientes, tal como previsto no código 2475 da tabela II das taxas genéricas (anexo ao DR 25/2009). Se a carteira de clientes adquirida for reconhecida como um ativo intangível, e não tiver uma vigência temporal limitada, não é possível determinar uma vida útil, havendo a amortização no período máximo de 10 anos. Essa amortização não é aceite fiscalmente, pois não resulta de um ativo intangível sujeito a deperecimento, ou seja, não possui uma vigência temporal limitada. Nesse caso, a entidade pode efetuar uma dedução fiscal, em partes iguais, durante os primeiros 20 períodos de tributação após o reconhecimento inicial, do custo de aquisição da carteira de clientes, conforme o n.º 1 do artigo 45.º-A do CIRC. Caso um dos critérios para o reconhecimento do ativo intangível não seja cumprido, a aquisição da carteira de clientes não pode ser reconhecida como ativo intangível. Nestas circunstâncias, a aquisição da carteira de clientes deve ser reconhecida como um gasto do período em que for incorrido (conta 688 - Outros gastos). |